segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Só Bom Jesus mesmo pro Recife Antigo
Neste domingo (27) fotografei alguns pontos estratégicos do Recife Antigo para ilustrar o meu trabalho. Sítio histórico e patrimônio cultural da Cidade, ele assinala o convívio conflitivo entre o novo e o velho, o moderno e o antigo, uso e desuso. A política exercida pela Prefeitura em tentar deslanchar de vez esta ilha histórica como pólo turístico e estender seu uso para além dos quatros dias carnavalescos revelam-se em cada rua, esquina e, sobretudo, prédios e sobrados que, utilizados para diversos fins, revelam tratamento diferenciado e um complexo jogo de interesses.
Estátua do cantor e compositor Chico Science, na esquina da Rua da Moeda com a Rua Mariz e Barros. Foto: autor
A política de patrimonialização, embora hoje mais abrangente, ainda guarda resquícios delicados quanto à conservação do patrimônio dito "pedra e cal" que, no Brasil, entre fins do século XIX e início do século XX, residia sobre a legitimação da história-memória de uma elite. Contemporaneamente, sob o discurso do direito que as gerações futuras detêm na visibilidade de sua história, a ação reside, geralmente, no restauro das fachadas e dos aspectos originas da arquitetura dos prédios selecionados. No caso do Recife Antigo é curioso notar que essas obras são intermináveis, já fazem parte do cotidiano, mas não de seu cartão postal. Não desconheço os problemas técnicos e de que se trata de um processo longo, mas alguns estão prestes a fazer aniversário de dez aninhos. Isso é coisa que se sobressai mesmo àqueles que não o frequentam assiduamente. A transparência dos gastos públicos está em letras quase ilegíveis, grafadas em enferrujada placas presas nas calçadas, também em estado deplorável.

Rua Vigário Tenório, esquina com a Downton. Foto: autor
De segunda a sexta-feira local administrativo, nos fins de semana reveste-se da "multiculturalidade", que tanto a Prefeitura difunde. O som dos diversos maracatus que ali ensaiam ressoa nas ruas adjacentes, e do Marco Zero pode-se brincar de regente das batucadas. Aqui se tem a visão verde-azulada de nosso litoral, do parque das esculturas do artista plástico Francisco Brennand e de sua Torre de Cristal. Marco Zero também do abandono e da falta de utilização adequada de espaços; se podemos falar em janela temporal para o vislumbre da passagem de colônia de pescadores a centro administrativo do Brasil-Holandês, ela se encontra bem sedimentada sob as novas construções.
Quando pensamos a respeito dessas novas reformas - me refiro as dos armazéns - inúmeras perguntas emergem, sobretudo "a quem se dirige esses investimentos?" e "Porque só agora?". Faz-se necessário que esses espaços fujam do simples restauro, que sejam reinventados e utilizados em toda a sua totalidade em prol da população do Recife e da sua educação, ambos privados quando da construção de obra-pra-turista-ver. Que sejam dinâmicos e se transformem em museus vivos de novos laços, atendendo as demandas sócio-culturais, ao invés da institucionalizada política de pão e circo, e, principalmente, que não se configure o reflexo do museu morto que é o Recife Antigo, lúgubre e estanque.

Andamento das obras do Cais do Apolo. Foto: autor

João Paulo Nascimento de Lucena

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