segunda-feira, 29 de agosto de 2011

A mangueira e suas descontinuidades


Sempre em transformação, os lugares têm essa coisa especial de funcionarem como ferramenta cognitiva na recordação de memórias, atuando sobre e por elas sendo alterados. Talvez isto se torne mais elucidativo com um exemplo.
Semana passada, fiz uma das minhas visitas àquele bairro que mais tarde seria para mim motivo concomitante de felicidade e tristeza. Fui morar na comunidade do Sítio do Cardoso – ou simplesmente o Cardoso para àqueles que com ele já tiveram algum tipo de laço, mesmo que tênue e breve - recém-nascido. Localizada na Rua Campos Sales, nossa casa era a última de uma série de outras pequenas que alinhadas à esquerda de quem no beco entrava, tinham por quintal-comum um mato alto e uma mangueira espada. Para quem não sabe sua localização, a Rua Campos Sales é a primeira à esquerda após o cruzamento da Rua José Osório com a Av. Caxangá, sentido Camaragibe.
Quando pequeno a árvore era enorme, e subir em seus galhos consistia num dos meus passatempos e desafios pessoais favoritos. Porém, hoje, e com a sucessão não regular de visitas, tenho a impressão de que ela estar cada vez menor. É como se sua imagem matriz fosse acrescentada por pinceladas de esquecimento, ao mesmo tempo em que dela se desvincula outra imagem: a de suas transformações ao longo do tempo. A experiência e o esquecimento, portanto, emergem como mediadores da relação lugar-memória, ora acrescentando ora retirando leves camadas desse quadro de tintas frescas que se chama memória.

João Paulo Nascimento de Lucena


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