terça-feira, 2 de agosto de 2011

Andanças pelo Sertão

Há alguns meses uma conspiração do cosmos vem me chamando para lugares por onde nunca andei...brevemente contarei por onde começou esta história e os rumos que ela já está tomando a partir de agora.
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Uma de minhas raízes e a que me mais chama vem de um lugar muito conhecido pelas bandas daqui ... A princípio a família Alencar se instalou no Brasil na cidade de Exu, depois fomos conquistando várias outras cidades do nordeste. Meu querido avô, Raimundo Nunes de Castro Alencar, nasceu no Crato no Ceará e é pra lá que em breve seguirei viagem, pois sempre percebi o chamado de ir em busca de minhas raízes... Sugiro até que assistam um vídeo simples e muito gostoso de se ver, com o título muito do modesto: "'amília alencar vida e bravura" (segue o link) elaborado por um parente recem ''descoberto" na exposição de um mini-curso de fotografia - Imagens do feminismos no SOS Corpo - o qual participei com intuito de futuramente realizar uma exposição construída em conjunto com as parteiras que já conheci ao longo da minha pesquisa. Ele se chama Cincinato Alencar, e logo percebi que é inteiramente conectado com a sua história... com a minha história, com a nossa história, depois vocês vão entender o porque:
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Um outro caminho recentemente des-coberto, podemos dizer assim, vem desde outubro passado. que culminou no interesse de me ver envolvida com a organização do VII Encontro Regional de Psicologia N/NE (EREP) com o tema: PISANDO NA TERRA: NO COMPASSO DO SAMBA, OS SABERES SE ENCONTRAM. Este ano nossos encontramentos e encontrações acontecerão na ilha do Massangano, entre Petrolina (PE) e Juazeiro (BA) também em outubro, na beira do São Franscisco, repleta de energia positiva, sentimento de comunidade e festanças durante o ano inteiro, que inclusive nosso querido Ariano Suassuna é padrinho do Samba de Véio, uma das grandes manifestaçoes culturais da ilha (assisti um curta-metragem na ilha que ele aprece e depois confirmado pela diretora da escola da ilha, Mara, também mãe de uma nova amiga do Vale do São Franscisco, Samara Gabriele.
Tem sido uma experiência engrandecedora principalmente porque o que eu acredito, junto com o que tenho aprendido com as parteiras da tradição através da pesquisa, junto com meus amig@s erepian@s que participam da organização, estamos trilhando um caminho de colocar em prática, numa grande intensidade, a troca de saberes, práticas, conhecimentos, construções e desconstruções, e preocupações compartilhadas em relação ao cuidar... de si, do outro, da natureza, do todo!

E aí eu começo assim a trilhar meus caminhos rumo ao sertão. Este último fim de semana tive a oportunidade de ir a ilha do Massangano para a presencial do VII EREP e, lhes digo sinceramente que não fantasiei sobre como seria Petrolina ou Juazeiro até então conhecida apenas na música do meu parente distante Luís Gonzaga, muito menos fantasiei ou criei expectativas sobre como seria a ilha tão falada pelos meus amig@s, mas eu tinha certeza que eu iria encontrar uma parteira... nem que fosse apenas uma, eu iria encontrar... E encontrei.
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Tivemos muito pouco tempo para conversar, pois havia muitas atividades previstas para nós da organização (e que só pude participar no fim de semana), mas o tempo que eu, a parteira e duas amigas erepianas tivemos foi tão belo, mágico e inacreditavelemente real. Nossa já amada e respeitada parteira da tradição da ilha do Massangano (PE) se chama Maria das Dores, uma senhorinha muito linda, forte, sagaz e sábia. Com ela compartilhei saberes e práticas já conhecidas e descobri outras tantas práticas des-conhecidas para o trabalho de parto, o resguardo, o trato com umbigo do bebê e o cuidado da placenta sair toda, sabendo que "A mulher só pari depois que a placenta sai".
Hoje, ela diz se sentir velha e cansada, mas que nunca recusaria atender uma mulher parindo... D. Maria, como eu a chamei, mas ela é conhecida como Das Dores... nos disse que tem muito menino na ilha que foi ela que pegou, e que já tem menino que é avô, e que não lembra de uma rua da ilha que já não tenha pego menino. D. Maria das Dores também nos contou que já foi chamada várias vezes por marido das mulheres de madrugada, para sair de barquinho no escuro pelas localidades vizinhas para partejar, mas não tinha medo. Quando perguntei como ela tinha aprendido, ela disse que aprendeu com sua mãe, e que esta aprendeu com sua avó... Nos disse que sua mãe sempre lhe mostrava como fazer, levando-a junto para atender os partos.
D. Maria sempre foi muito curiosa, mas tinha medo: "Eu moça, tinha medo que se os homens me vissem ali, pegando menino, aí não iam me querer, eu não ia casar". Depois ela retomou que isso não fora um problema, ela se casou teve 10 filhos e criou mais uma. Dos partos que teve, por duas vezes precisou ir ao hospital, um deles foi o segundo filho. E, até hoje ela lembra que foi um sofrimento estar naquele lugar, sentindo na pele o desrespeito por parte de alguns profissionais. Conversamos ainda se há alguma mulher na ilha que seja sua aprendiz de parteira. Meio tristonha, D. Maria nos disse que ninguém se interessava mais em ser parteira lá. E, apesar da sabedoria medicinal popular ser bastante forte na ilha, a maioria das gestantes querem ter seu filho no hospital.
Conversar um pouquinho com D. Maria das Dores foi um dos momentos mais emocionantes e prazerosos que tive na ilha, como conhecer pessoas maravilhosas, como me banhar nas águas (geladas!!) do São Franscisco, e tenho certeza que nós ainda iremos nos encontrar e TROCAR mais experiências... pois como havia falado anteriormente a respeito da consciência do cuidado de si e do que está a sua volta, espera-se que essa construção não dure apenas por um momento nem para mim, nem para os participantes estudantes e profissionais e nem para os participantes moradores da ilha, mas o que estamos construindo cresça, ressoe e flua cada vez mais nas nossas vidas.

Como já me estendi muito gostaria de fechar sonoramente com a música "Vida de viajante", do meu parente - não só por um frasco de sangue, mas por tudo que ele representou e representa em minha vida e na vida dos nordestinos (estou toda orgulhosa:) ), o grande Luís Gonzaga... na expectativa de que logo farei o caminho de volta para casa...

Minha vida é andar
Por esse país / Pra ver se um dia / Descanso feliz / Guardando as recordações / Das terras onde passei / Andando pelos sertões / E dos amigos que lá deixei / Chuva e sol / Poeira e carvão / Longe de casa / Sigo o roteiro / Mais uma estação / E a saudade no coração / Minha vida é andar... / Mar e terra / Inverno e verão / Mostra o sorriso / Mostra a alegria / Mas eu mesmo não / E a saudade no coração / Minha vida é andar...

confiram estes links tbm:


muito grata,
Alessandra Alencar

5 comentários:

  1. Que lindo Alê!
    Deu pra sentir sua emoção nas palavras...
    saudade já!
    Bjo grande!

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  2. Sempre terá as águas do Velho Chico para te receber de braços abertos!

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  3. lindo texto Alê... muitos encontramentos, muitas cores, muitas sensações e emoções!!!
    Vamos seguir de mãos dadas nessa construção e em muitas outras que vão surgir!!!
    Muito bom ter sido afetada por sua presença!!!

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  4. Olha, Alê. Interessante que tem também a história de seu Antônio Alencar, lá de Granito/Exu também, e a caminhada para a chapada no início do ano, acho que seria bom encontrares ele, um alencar muito especial como você.
    Cheiros e luz
    Deyvid

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